Em latim, o s intervocálico tinha valor fonético equivalente ao ss do português, tal como em espanhol. Em nossa língua, entretanto, o s intervocálico adquiriu som de z, o que gera, frequentemente, confusão e incerteza na grafia de certas palavras, quando titubeamos entre s e z.
Não raro, lemos em escritos médicos expressões como estas: “hérnia hiatal por deslisamento”, “retardo de esvasiamento”, “extravazamento de líquido”, “atrazo na eliminação do contraste”, e outras semelhantes.
Analisemos os exemplos citados:
1. Deslizamento – Derivado do verbo deslizar. Há em português o verbo deslisar, com s (des + liso + ar), com o mesmo sentido de alisar, tornar liso, e deslizar, com z, que significa escorregar, resvalar, passar de manso.[1]
O verbo deslizar, de origem incerta e de formação mais antiga que deslisar, já se encontra registrado no dicionário de Moraes (1813). Em espanhol, o verbo deslizar também se escreve com z enquanto liso se escreve com s, fato este que, segundo Nascentes indica origens diversas para ambos os vocábulos.[2] Para outros, o vocábulo teria vindo para o português através do espanhol, o que explicaria a grafia com z.[3]
2. Esvaziamento – Derivado de esvaziar, que por sua vez, origina-se de vazio, do latim vacivus, vago, desocupado. Neste caso, entende-se mais facilmente porque vazio se deve grafar com z. Segundo a fonética histórica, os grupos ti e ci, do latim vulgar, evoluíram naturalmente para z. Ex.: judiciu, juízo; cinícia, cinza; ratione, razão. Somente em palavras introduzidas posteriormente pelas camadas mais cultas da população, ti evoluiu para ç. Ex.: gratia, graça; capitia, cabeça.[4]
3. Extravasamento – Embora vazio e vazar se escrevam com z, extravasar, do mesmo modo que envasar, deve grafar-se com s. Todos os léxicos relacionam estes verbos com vaso, do latim vasum.
4. Atraso – Deverbal de atrasar, formado de atrás + ar. Atrás por sua vez, formou-se da preposição a +trás, que se escreve com s, ao contrário de traz, do verbo trazer, que se escreve com z. É óbvio, portanto, que atraso e todos os seus cognatos devem ser escritos com se não com z.
Muitas outras palavras existem em que vacilamos entre s e z. Na dúvida, o melhor é recorrer a um bom dicionário ou, se possível, a mais de um, pois muitas vezes há divergências até mesmo entre os lexicógrafos.
Nos exemplos citados as formas corretas são: “hérnia hiatal por deslizamento”, “retardo de esvaziamento”, “extravasamento de líquido” e “atraso na eliminação do contraste”.