Momento é de resistência contra conservadorismo e retrocessos
Combate às desigualdades deu passos importantes mais recentemente, mas a conjuntura aponta para maiores desafios na luta contra preconceitos, atrasos e retirada de direitos
Mais um Dia Nacional da Consciência Negra chegou. Neste 20 de novembro, a avaliação é de que, apesar de os debates e as ações terem se intensificado nos últimos anos, os avanços contra o racismo ainda são tímidos. O combate às desigualdades deu passos importantes com a criação de programa sociais e da lei das cotas, por exemplo. Mas é consenso de que muito ainda precisa ser feito para reparar a dívida social histórica com a população negra.
Os desafios serão ainda maiores, diante da vitória nas urnas de um projeto que já deixou claro em diversos momentos que está baseado no conservadorismo e no preconceito, não acreditando na “democracia racial”. O que podem parecer declarações individuais de um ou de outro membro do futuro governo evidenciam, na verdade, o discurso ideológico e político de um grupo que chega ao poder para promover retrocessos.
Esse, aliás, é o recado do presidente da Fenae, Jair Pedro Ferreira. “O momento é de resistência! Os ataques conservadores, iniciados há pouco mais de dois anos, poderão se tornar mais frequentes e intensos. Inspirados em Zumbi, não há outra saída a não ser reforçar a mobilização contra a retirada de direitos e o enfraquecimento da luta contra as desigualdades em nosso país. Não podemos permitir o atraso e o triunfo dos discursos de ódio e de discriminação contra quem quer que seja”, afirma.
Para Almir Aguiar, secretário de Combate ao Racismo da Contraf-CUT, “é inaceitável discursos como a do vice-presidente da República eleito de que nós brasileiros, herdamos ‘a indolência (preguiça) do índio’ e a ‘malandragem’ do negro, e a patética declaração do presidente eleito se referindo a comunidade quilombola com a insinuação de que a medida de peso para os negros é a ‘arrouba’. O ataque às cotas raciais são parte deste projeto que tenta impor um retrocesso sem precedentes no Brasil moderno”, diz.
Alguns números da desigualdade
No Brasil, os negros representam 54% da população, segundo dados de 2015 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No grupo dos 10% mais pobres, os negros representam 75% das pessoas, mas entre o 1% mais rico, somam apenas 17,8% dos integrantes.
Os negros representam 64% da população carcerária e apenas 12,8% dos estudantes de nível superior. Nos últimos dez anos, os assassinatos de mulheres brancas caíram 8%, enquanto entre as negras aumentaram 15,4%. Dos 12,5 milhões de desempregados no terceiro trimestre deste ano, 64,2% eram negros. A taxa de desocupação dos que se declararam brancos foi de 9,4%. Já a taxa dos pardos e pretos foi de 14,6% e 13,8%, superiores à taxa nacional de 11,9%.
Nos bancos, a realidade não é diferente. Apenas 3,4% dos bancários são negros. Em média, a remuneração dos profissionais negros representa 87,3% do salário dos brancos. Apenas 4,8% dos negros ocupam cargos de diretorias nos bancos. E somente 18% dos bancários negros recebem promoções na carreira.
“Não tem como tratar igual os desiguais. A história do Brasil nos mostra que quem tem dinheiro paga as escolas de seus filhos e prepara estas crianças para disputar as vagas nas universidades públicas. E o pobre que não tem o ensino adequado quando chega para disputar a universidade ele vai pagar, porque ele não tem como disputar com quem se preparou”, destaca Maria Júlia Nogueira, secretária de Combate ao Racismo da CUT