Os EUA e o mundo no início da Guerra Fria (1945-1949)

A história universal dos últimos 50 anos do século XX foi inteiramente condicionada pelos resultados da 2ª Guerra Mundial quando, no ano de 1945, depois de 6 anos de morte e de destruição, a Grande Aliança (os E.U.A., a Grã-Bretanha e a URSS) conseguiu derrotar incondicionalmente as forças do Eixo (a Alemanha nazista, a Itália fascista e o Japão do micado). No final daquela catástrofe, depois de ter-se dissipado a fumaça e em meios aos escombros que cobriam 50 milhões de mortos, restaram apenas duas potências em pé: os Estados Unidos da América e a União Soviética, logo chamadas, com toda a razão, de superpotências. O enfrentamento entre elas no período que se seguiu fez a humanidade inteira tremer frente ao seu destino.

EUA e URSS se enfrentaram na chamada Guerra Fria.
EUA e URSS se enfrentaram na chamada Guerra Fria. Foto: Reprodução

Um tratado de Tordesilhas ideológico

Fraudando as expectativas daqueles que esperavam um pós-guerra de harmonia, entendimento e colaboração entre os vitoriosos, baseado na aceitação inicial das “4 polícias” do presidente Franklin D. Roosevelt (os EUA, a URSS, a Grã-Bretanha e a China), o que se viu foi o contrário. Ao invés do mundo conhecer a merecida paz, os dois gigantes, mal encerrado o clamor das armas, passaram a se desentender. Para os soviéticos  culpa pelo agravamento da Guerra Fria devia-se aos americanos que, especialmente depois da explosão das Bombas Atômicas sobre o Japão,  agiam como donos do mundo. Para os ianques, ao contrário, eram os soviéticos quem desejavam impor sua ideologia comunista ao restante do planeta, área rapidamente batizada de “Mundo Livre”.

Não chegando a acordo nenhum, ambos trataram de armar-se lançando-se na mais perigosa e custosa corrida armamentista de todos os tempos. Uma organização independente, a Watchworld, calculou os gastos militares da Guerra Fria, entre 1948-1988, em U$ 17 trilhões de dólares! Ambos os lados, por sua vez, arregimentaram, em tratados ou protocolos, o maior número de povos e países para a sua causa. O mundo dividiu-se em dois campos antagônicos, separados por uma sinuosa linha que saía de um polo ao outro.

Até 1949, somente os Estados Unidos possuíam bombas atômicas.
Até 1949, somente os Estados Unidos possuíam bombas atômicas. Foto: Reprodução

Mundo Livre vs Cortina de Ferro

De uma lado dessa linha, na sua parte Ocidental segundo a visão americana, ficava o “Mundo Livre”, os Estados Unidos e os seus aliados. Do outro, atrás da “Cortina de Ferro”, alinhavam-se a URSS e seus satélites, esmagados pela tirania comunista. Dispensável dizer que para os soviéticos era exatamente o contrário. Para Zdánov, por exemplo, o ideólogo e segundo homem do regime comunista, tratava-se, como discursou na Conferencia de Schreiberhau, em setembro de 1947, da existência de “dois mundos”, opostos entre si. Um deles em mãos do “bando imperialista e antidemocrático”, liderado pelos americanos, e o outro composto pelas “forças antiimperialistas e antifascistas”, lideradas pelos soviéticos. Ambos consideravam seus regimes inconciliáveis.

Foto: Reprodução

Capitalismo vs Comunismo, Democracia vs Totalitarismo, eram polarizações tão absolutas, tão irreversíveis, que apenas aguardavam o momento oportuno para desencadear a 3ª Guerra Mundial que, dado o potencial atômico que dispunham seria a guerra final. Esta idéia do equilíbrio de forças entre as superpotências, no entanto, não correspondia à realidade. O potencial americano, excetuando-se na capacidade  de mútua destruição,  sempre foi varias vezes superior ao dos soviéticos.

O mundo do pós-guerra

Quem por acaso embarcasse num hipotético vôo sobre o mundo do após-guerra, circundando-o, veria uma paisagem desoladora, quase lunar, lá de cima. Cruzando a Inglaterra, por exemplo, perceberia claramente que seus principais portos, Liverpool e Bristol, e suas grandes cidades industrias, como Londres e Manchester, estavam totalmente arrasadas. Lá embaixo restava um povo exausto, num país completamente endividado, em vésperas de perder o império.

Se o viajante atravessasse o Canal da Mancha e sobrevoasse o território francês, o que veria não seria muito diferente. Castigada pela bombas dos aliados e pela ocupação de quase quatro anos pelo exército nazista, a pátria do General De Gaulle mergulhara na tristeza. Mesmo ficando afinal ao lado do vencedor, a França, esvaída, amargara ter tido o único governo que colaborara com Hitler: o governo de Vichy, liderado pelo Marechal Petain.

Avançando continente europeu adentro, no tal vôo imaginário, atravessando o rio Reno, chega-se à Alemanha. Nada está em pé lá embaixo. Na região do Ruhr, que abrigava o grande parque industrial pesado alemão, só vemos destroços, pedras e ferro retorcido. Nenhuma fabrica restou intacta. Além dos 6 milhões de mortos, civis e militares, suas principais cidades viraram ruínas. Berlim, a ex-capital do IIIº Reich, contara mais de 250 mil prédios destruídos, e 60% da sua extensão urbana reduzira-se a escombros. Os sobreviventes, uns 60 milhões de alemães, viviam em meio a frio, fome e desesperança.

Churchill, Truman e Stalin, no tempo em tudo eram rosas.
Churchill, Truman e Stalin, no tempo em tudo eram rosas. Foto: Reprodução

Ruínas e destruição por tudo

Mais adiante, passando sobre a Polônia, o quadro era mais horripilante ainda. Varsóvia e Cracóvia estavam a zero. O país fora palco, em momentos distintos, de dois enfrentamentos: em 1939 foram os exércitos alemães e soviéticos, então aliados, quem, ao invadir o pais, eliminaram os poloneses; em 1944-45, foram os nazistas e soviéticos, inimigos mortais, quem se enfrentaram no seu martirizado solo. Além disso, os nazistas escolheram-na para abrigar a maioria dos seus campos de extermínio. Foi em Auschwitz, Sobibor, Majdaneck, Chelmno e Treblinka, que deu-se o genocídio de grande parte dos judeus, de ciganos e de prisioneiros russos e poloneses, que seguramente devem ter somado bem mais de 6 milhões de vítimas.

Planando sobre as estepes russas a paisagem de horror continuava. Praticamente todas as aldeias da Ucrânia e da Rússia branca haviam sido destruídas ou queimadas pelos invasores. O gado morto e a lavoura abandonada. As minas de carvão, ao sul, na região do Donetz, estavam inundadas, e os poços de petróleo do Cáucaso ainda estavam envoltos em fogo. As estradas de ferro bombardeadas e desmanteladas estavam longe de poderem ser reaproveitadas algum dia próximo.

As cidades de Leningrado (600 mil mortos civis) e Stalingrado (300 mil mortos) foram palcos de grandes batalhas e tinham sido quase que totalmente devastadas. Moscou, porém, sobrevivera a um período curto de sitio, não escapando, porém, de ser bombardeada. Pode-se dizer que a parte ocidental da Rússia, a região que vai do Belarus ao oeste até os Montes Urais, no leste, até então a parte mais industrializada e próspera da União Soviética, reduzira-se a um entulho só. As perdas humanas foram assombrosas: estima-se entre 17 a 20 milhões de russos mortos (7 milhões deles soldados).

Stalingrado em ruínas.
Stalingrado em ruínas. Foto: Reprodução

A desolação da Ásia

Seguindo-se adiante na viagem, atravessando a Sibéria, chega-se à China. Além de ter padecido da ocupação nipônica desde 1936, quando o exército japonês assaltou-a partindo da Manchúria, o imenso país oriental encontrava-se em guerra civil. De um lado as forças nacionalistas do general Chian Kai-Shek, do outro os guerrilheiros de Mao Tse-tung, o líder comunista que comandara a resistência ao invasor. Depois de terem mantido uma curta trégua, estavam novamente em guerra, que somente seria decidida a favor dos revolucionários de Mao em 1949. A completa desorganização do seus sistema de irrigação, resultado da guerra, jogara os chineses numa miséria assombrosa. As cidades como Cantão, Shangai, Pequim e Nanquim, apinhavam-se de refugiados e de gente faminta vinda dos campos paralisados. Era um caos total.

Finalmente alcança-se o Extremo Oriente. Atinge-se o Japão. Honshü, a ilha maior do arquipélago, que abriga Tóquio, Osaka e Nagoya, havia sido, desde 1943, o alvo preferido da Força Aérea Americana. Em 1945 fora bombardeada diariamente, nada mais restando o que fosse produtivo ou reaproveitado. Para desgraça ainda maior dos japoneses, duas das suas cidades foram escolhidas como alvo-demontração da capacidade nuclear norte-americana: em 6 e 9 de agosto de 1945, Hiroshima e Nagasaki foram varridas por explosões atômicas, num total de 200 mil mortos. O império do Sol Nascente deixara de existir. Naquele momento era um conglomerado de 3 mil ilhas empobrecidas, reduzido às cinzas e à  impotência.

China, um cenário desolados no fim da guerra.
China, um cenário desolados no fim da guerra. Foto: Reprodução

Quadro de perdas humanas por país:

Alemanha – 5.000.000

França – 535.000

Itália – 450.000

Polônia – 5.800.000

Grã-Bretanha – 380.000

Iugoslávia – 1.600.000

Tchecoslováquia – 415.000

URSS – 17.000.000

USA – 300.000

Japão – 1.500.000

China – 2.200.000

O poder dos Estados Unidos da América

Poucas nações tiveram na História o feliz destino dos Estados Unidos da América. Apesar de envolverem-se em duas guerras mundiais, a de 1914-18 e a de 1939-45, os americanos, por estarem bem afastados dos frontes, protegidos por dois imensos Oceanos, o Pacífico e o Atlântico, pouco sofreram diretamente com as conseqüências delas. Mesmo  perdendo 300 mil homens, praticamente não contabilizaram entre eles vitimas civis. Nova Iorque, Chicago, Detroit, e os demais centros industriais do país, não sofreram um só ataque aéreo, nem seus campos tiveram que suspender as colheitas ou abater o gado às pressas em razão de ataques ou invasões.

Bem ao contrário. As fábricas americanas, sem medo de se verem destruídas, produziram quantidades fantásticas de material bélico, permitindo suprir todas as necessidades das forças armadas nos frontes de batalha. 17 milhões de homens e mulheres foram convocados para todo o tipo de serviço de guerra, terminando definitivamente com a Grande Depressão que atormentara o país de uma maneira tão dramática nos anos trinta.

O poder atômico.
O poder atômico. Foto: Reprodução

Organizando o mundo

Conscientes que o mundo do pós-guerra giraria ao redor dos seus interesses, os Estados Unidos preocuparam-se em criar as novas bases da Ordem Mundial do pós-guerra. Convocaram para tanto, bem antes que a guerra acabasse, entre 1º e 22 de julho de 1944, em Bretton Woods, perto de Nova Iorque, uma conferencia para determinar quais seriam as diretrizes econômicas futuras. Sob a orientação de J.M. Keynes,  acertou-se lá, na presença de  44 delegados de diversos países, inclusive a URSS, que seria criado um Fundo Monetário Internacional (International Monetary Found) para regular as relações financeiras entre as nações e um Banco para a Reconstrução Mundial (International Bank for Reconstruction and Development), responsável pela recuperação das economias combalidas pela guerra. Acatou-se que o sistema funcionaria com o dólar sendo lastreado pelo ouro. Como os Estados Unidos possuíam a maior reserva aurífera do mundo (acredita-se que perfazia 60% do total) e a sua moeda – o dólar – era a única aceita e conversível por todos os demais, isto fez com que sua  liderança fosse quase incontestável  no pós-guerra.

Keynes e o representante soviético na fundação do FMI (1944).
Keynes e o representante soviético na fundação do FMI (1944). Foto: Reprodução

Poder e riqueza

Terminada a guerra contra a Alemanha nazista em maio, e contra o Japão em agosto de 1945, num mundo exaurido e arruinado, os Estados Unidos estavam prontos para liderar o mundo. Tinham naquele momento, apesar de perfazerem menos de 6% da população mundial, o controle sobre 50% da produção industrial existente (entre 1938 a 1947, o índice da produção cresceu em 63%); quase todas as reservas de ouro do mundo (elas pularam de 14.592 milhões para 22.868 milhões em dez anos); as cidades e a população civil intocadas; suas forças espalhadas pelo mundo inteiro; e, como arremate, nesta incrível concentração  de poder, eram a única das nações em posse de um arsenal nuclear. Nunca, enfatize-se, um só país na História arrematara, simultaneamente, o poder militar, o econômico, o financeiro e o atômico.

A contenção ao comunismo

Dois acontecimentos internos, quase simultâneos, criaram as pré-condições para que os Estados Unidos se lançassem na Guerra Fria. O primeiro foi a morte do Presidente Franklin Delano Roosevelt ocorrida em maio de 1945 e, em seguida, em 1946, a eleição de um Congresso predominantemente republicano (partido conservador). Roosevelt acreditava num mundo do pós-guerra  controlado pelos EUA, em comum acordo com a URSS (o que Stalin denominou de “coexistência pacífica”). Sua morte fez com que seu sucessor Harry Truman, consciente do poder nuclear, abandonasse esta posição, aderindo à tese de Kennan do “enfrentamento com o comunismo”.

A eleição de uma maioria republicana, estreitamente ligada à indústria de armamento e às atividades anticomunistas (embrião do que mais tarde o presidente D. Eisenhower denominou de Complexo militar-industrial), revelou igualmente uma mudança da opinião pública americana. Um estado de espírito mais conservador que não demorou muito para resvalar para a paranóia anticomunista, manifestando-se, simultaneamente, contra as reformas sociais da política do New Deal e contra acordos com os comunistas. Eles, “os vermelhos”, deveriam ser combatidos em todas as frentes. A ascensão à presidência de Harry Truman, o vice-presidente de Roosevelt, e o congresso republicano, tornaram as relações com a URSS cada vez mais tensa. Um “clima frio”, como logo foi constatado, começou a dominar o cenário internacional. Passado o perigo nazista, os americanos receavam agora os comunistas.

O presidente Truman deu os primeiros passos na Guerra Fria.
O presidente Truman deu os primeiros passos na Guerra Fria. Foto: Reprodução

A mobilização anticomunista

O elemento deflagrador da mobilização anticomunista deu-se com o célebre discurso de Winston Churchill, feito em Fulton, no Missouri, em 5 de março em 1946, quando o ex-primeiro ministro britânico no seu pronunciamento intitulado Sinews of Peace (Sustentáculo da paz), denunciou o Comunismo Soviético por estender uma “Cortina de Ferro”(Iron Curtein), sobre a sua área ocupada na Europa, conclamando os poderes anglo-saxões, a Grã-Bretanha e os Estados Unidos, a enfrentarem-na.

Com essa inversão, essa completa mudança de postura, de aliado da URSS para seu principal adversário, os Estados Unidos obrigaram-se a elaboraram uma doutrina condizente com os novos tempos: a National Security Doctrine ( Doutrina da Segurança Nacional). Segundo ela um tipo singular de enfrentamento mortal desenhava-se no horizonte; simultaneamente estratégico e  ideológico. Os Estados Unidos tinham agora seus interesses estratégicos e suas bases militares espalhadas por todos os continentes. Eram uma potência global, cuja preocupação abarcava o mundo inteiro. O único rival a vista era o movimento comunista que tinha sede em Moscou, e que também manifestava ambições expansionistas. O marxismo, para os estrategistas do Pentágono, nada mais era do que o pretexto, uma máscara ideológica, para o domínio dos russos.

Truman e Churchill no Missouri, 1946.
Truman e Churchill no Missouri, 1946. Foto: Reprodução

Os frontes da Guerra Fria

Havia dois frontes nesta vasta política de contenção: um estratégico-militar, coberto por tratados específicos, e outro ideológico, que mobilizaria a opinião pública e o serviço de contra-espionagem – a CIA [ Central Inteligente Agency] foi criada em 1947 para dar combate ao “perigo vermelho” no exterior.

A decisão do caminho a ser seguido em relação à URSS foi traçado por George Kennan, um alto funcionário americano, que defendeu a “contenção” contra o comunismo. Os soviéticos somente seriam detidos por meio de uma enérgica política de enfrentamento, de jogo duro. Esta política, que levou a uma profunda intoxicação ideológica dos cidadãos americanos, contribuiu para  que os Estados Unidos obtivessem o apoio interno necessário a que reativassem, mesmo em tempo de paz, a sua industria bélica para atender as necessidades da Guerra Fria.

CIA, instituição da Guerra Fria.
CIA, instituição da Guerra Fria. Foto: Reprodução

A doutrina Truman e o Plano Marshall

A conseqüência lógica da “contenção ao comunismo” foi o lançamento da Doutrina Truman, o primeiro pilar da Guerra Fria. Anunciada em março de 1947, a pretexto de socorrer a Turquia e a Grécia (envolvida numa guerra civil entre comunistas e monarquistas), o presidente dos Estados Unidos garantia que sua forças militares estariam sempre prontas a intervir em escala mundial desde que fosse preciso defender um país aliado da agressão externa (da URSS) ou da subversão interna, insuflada pelo movimento comunista internacional, a serviço dos soviéticos. Na prática, os Estados Unidos se tornariam dali em diante na polícia do mundo, realizando intervenções em escala planetária na defesa da sua estratégia (*).

O segundo pilar, aguçando ainda mais a separação das superpotências, deu-se com o anúncio do Plano Marshall, que foi um projeto de recuperação econômica dos países envolvidos na guerra. Vindo à público também no ano de 1947, em 5 de julho, em Harvard, este plano deve seu nome ao General George Marshall, secretário-de-estado do governo Truman. Por ele, os americanos colocariam à disposição dos governos que o solicitassem uma quantia fabulosa de dólares (no total ultrapassou a U$ 13 bilhões de dólares) para que as populações européias pudessem “voltar às condições políticas e sociais nas quais possam sobreviver as instituições livres”, e a um padrão superior que os livrasse da “tentação vermelha”, isto é, de votar nos partidos comunistas que, devido a vitória soviética, gozavam então de enorme prestígio. Aceitando os dólares generosamente ofertados eles  manteríam-se fiéis aos Estados Unidos.

Enquanto os europeus ocidentais (ingleses, franceses, belgas, holandeses, italianos e alemães) aderiram ao plano com entusiasmo, Stalin não só rejeitou-o como proibiu aos países da sua órbita (Polônia, Hungria, Tchecoslováquia, Iugoslávia, Romênia e Bulgária) a que o aceitassem. A doutrina e o plano fizeram ainda mais por separar o mundo em duas esferas de influência.

(*) Obedecendo à doutrina Truman, os EUA intervieram na Guerra da Coréia (1950-3) e na Guerra do Vietnã (1962-75), como também derrubaram os regimes de Mossadegh no Irã em 1953, e o do general Jacobo Arbenz na Guatemala em 1954. Em 1961 apoiaram a invasão de Cuba para derrubar Fidel Castro e, com a criação da Escola das Américas, no Panamá, adestraram os militares latino-americanos na contra-insurgência, estimulando-os a que tomassem o poder nos seus respectivos países.

Escudo do Plano Marshall.
Escudo do Plano Marshall. Foto: Reprodução

Os Tratados da Guerra Fria

Com a crescente histeria anticomunista (nos EUA, o Comitê de atividades antiamericanas deu início, em 1947,  à “caça aos comunistas”) a diplomacia americana tratou de  arregimentar parceiros no seu grande embate ideológico contra a URSS. O primeiro de uma série de tratados que assinaram foi o TIAR (INTER-AMERICAN TREATY OF RECIPROCAL ASSISTANCE, Tratado inter-americano de auxilio recíproco) acertado no Rio de Janeiro em 1947, afirmando o conceito de “defesa coletiva” do continente americano. Por ele, as nações latino-americanas formariam uma frente comum caso houvesse a agressão de uma “potência externa”(isto é, a URSS). O TIAR serviu também para que as relações entre os militares se estreitassem. Os generais latino-americanos passaram a ver seus países em função da estratégia da Guerra Fria (*).

Também passaram a preocupar-se com a “subversão interna”, especialmente depois da Revolução Cubana de 1959. A luta anticomunista interna, estendida aos governos populistas, considerados aliados dos comunistas, levou-os a instituírem, por meio de golpes militares, os Estados de Segurança Nacional (Brasil em 1964; Argentina em 1966 e novamente em 1976; Peru e Equador em 1968; Uruguai e Chile em 1973).

A OTAN e a OTASE

Em 1949, em 4 de abril, foi a vez dos países europeus abraçarem uma aliança liderada pelos Estados Unidos: a OTAN (North Atlantic Treaty Organization). Inicialmente com 12 membros, hoje ela conta com 19 (**). Com um estado-maior comum, a OTAN tinha a função original de proteger os países europeus ocidentais de um possível ataque das divisões soviéticas estacionadas na Alemanha Oriental. A motivação para que a aliança se realizasse deveu-se a crise de Berlim. Os EUA, ao se decidirem reerguer a indústria pesada alemã, assustaram os soviéticos. Stalin ordenou então o bloqueio por terra a Berlim, em protesto contra uma futura República Federal Alemã, vinculada aos americanos. Os aliados ocidentais superaram o problema recorrendo a uma ponte aérea que abasteceu a população de Berlim durante o desentendimento.

A estrela da OTAN.
A estrela da OTAN. Foto: Reprodução

Por último, em razão da guerra da Coréia (1950-53) e a do Vietnã (a primeira de 1945 –54 e a segunda de 1962-75), que os Estados Unidos consideraram como uma ameaça à sua hegemonia na Ásia, criou-se a OTASE (Southeast Asia Treaty Organization), em seguimento  ao tratado de defesa coletiva assinado em Manila, capital das Filipinas, em 8 de setembro de 1954, com o objetivo de conter o “expansionismo maoísta” na Ásia. A OTASE englobava, além dos EUA, antigos colonialismos, como o francês e o inglês, ex-dominios britânicos como a Austrália e a Nova Zelândia, e “protetorados dos ocidentais” como Filipinas e Tailândia, além do Paquistão.

Esses tratados refletiam, cada um a seu modo, a evidência do colossal poder que os Estados Unidos passaram a exercer no mundo do pós-guerra e fizeram por ajudar ainda mais seu vigor econômico e financeiro. Num planeta arruinado pela Guerra Mundial foi natural que os Estados Unidos, única potência sobrevivente, reordenasse o mundo, agora como superpotência, à sua vontade.

(*) exemplo disso é a fundação das Escola Superior de Guerra no Brasil, em 1949, e o livro “Geopolitica do Brasil”, do General Golbery do Couto e Silva

(**) os seus membros eram os EUA, o Canadá, a G.B., a França (retirou-se em 1966), a Alemanha Ocidental, a Itália, o Benelux, a Islândia, a Noruega, Portugal e a Dinamarca. Em 1998 foram acolhidas a Polônia, a República Tcheca e a Hungria, que, anteriormente pertenciam ao Pacto de Varsóvia, arquitetado pela URSS em 1955. Com a admissão de regimes fascistas como o de Salazar em Portugal, ou o dos militares turcos e gregos, a OTAN ficou em dificuldades em proclamar-se como “ defensora da democracia”.

Alerta contra a radioatividade.
Alerta contra a radioatividade. Foto: Reprodução

Bibliografia

  • Alperowitz, Gar- Diplomacia atômica, Editora Saga, Rio de Janeiro, 1969
  • Benz, Wolfgang – Graml, H. – Siglo XX: III, problemas mundiales, Siglo XXI editores, México, 1982
  • Benz, Wolfgang – Graml, H. – El siglo XX: Europa después de la 2ª Guerra mundial, Siglo XXI editores, México, 1986, 2 vols.
  • Calvocoressi, Peter – World Politics since 1945, Longman, Londres, 1996, 7ª ed.
  • Delmas, Claude – Armamentos Nucleares e Guerra Fria, Editora Perspectiva, São Paulo, 1979
  • Durand, Yves – Naissance de la guerre froide: 1944-1949, Messidor, Paris, 1984
  • Fontaine, André – Histoire de la Guerre Froide, Fayard, Paris, 1965, 2 vols.
  • Kennan, George – A Rússia e o Ocidente, Editora Forense, Rio de Janeiro, 1966

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