INVASÃO EM TERRAS INDÍGENAS É DISCUTIDA EM AUDIÊNCIA PÚBLICA NA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA

 

Por indicação do deputado Lazinho da Fetagro (PT), ocorreu na manhã desta segunda-feira (18), no Plenário das Deliberações, na Assembleia Legislativa, audiência pública para debater e tomar providências quanto à denúncia de invasão das terras indígenas (TI). Segundo o parlamentar, algumas com características de posse, outras para retirada de recursos naturais, no âmbito do Estado de Rondônia.
Segundo o parlamentar a audiência busca trazer ao debate e suscitar prováveis soluções quanto às denúncias de invasão de terras indígenas localizadas no Estado de Rondônia, buscando ouvir as minorias e dar-lhes voz. “Os índios, constitucionalmente, são os primeiros e naturais senhores da terra”, afirmou Lazinho.
As populações indígenas têm de ter o respeito do Estado que eles merecem. Muito antes de chegarmos aqui estas populações já existiam. A convivência pacífica e o respeito cabem a toda a sociedade.
O deputado Lazinho disse que, assim como o Estado tomou atitudes, após as audiências que tratamos de outros abusos cometidos por invasores, assim também espero que desta feita também sejam tomadas providências.
As falas dos representantes das diversas etnias indígenas foram unânimes na questão do controle das invasões das terras, sejam por grileiros, madeireiros e garimpeiros, trazendo sérios transtornos às comunidades.
O principal deles é a invasão e até loteamento de terras, com demarcações e comercializações de terrenos, conforme denúncias recebidas.
É preciso a ação conjunta de vários órgãos para inibir e expulsar os invasores, que também utilizam do manejo florestar autorizado nas proximidades das demarcações de TI para “esquentar” madeira extraída de forma ilegal.
Após os debates, Lazinho encaminhou os trabalhos agendando um encontro com os órgãos envolvidos. Também foi lido os encaminhamentos das ações levantadas durante a fase de debate. A ata foi assinada pelos debatedores.

Debatedores
O representante da Fundação Nacional do Índio (Funai), indigenista Nelson Deicke, apresentou slides explicativos referente a proteção territorial realizada pela fundação onde destacou as atribuições gerais do órgão e a atual situação das terras indígenas.
Explicou que a proteção envolve vigilância, monitoramento e fiscalização. O monitoramento, segundo ele, está na capacitação e envolvimento da comunidade indígena nas ações de vigilância territorial, além de ações de mapeamento e priorização das áreas de maior incidência de ilícitos ambientais.
Esclareceu que a fiscalização de terras indígenas é uma atribuição do Estado Brasileiro por meio dos órgãos responsáveis como a Funai, Ibama, Polícia Federal e parcerias firmadas entre a União, os estados e os municípios.
Segundo Nelson, a Funai não possui poder de polícia, desta forma, não pode multar ou prender indivíduos e equipamentos sem a presença das forças de segurança.
Ele apresentou as vulnerabilidades dos principais territórios indígenas de Rondônia, entre eles, a caça e pesca por não índios nos limites e interior das terras, tráfego de pessoas estranhas, extrativismo por não índios, assédio pela capacidade pesqueira, exploração econômica ilegal de madeira em larga escala e áreas de preservação estaduais invadidas por madeireiros e posseiros.
Eva Kanoê, representante da organização das nações indígenas brasileiras, afirmou que a situação das invasões de terras indígenas é gravíssimo e constatam-se várias invasões em Guajará-Mirim e que aguardam posicionamento das autoridades para a retirada destes invasores. “Pedimos que se faça cumprir a Lei e o direito dos povos indígenas para que possamos viver com dignidade”, disse.
Marcos Apurinã, representando a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e a Associação Nunerimane do Povo Indígena Apurinã de Rondônia, disse se preocupar com a forma que a questão das invasões de terras indígenas será solucionada, pois, segundo ele, essa é uma realidade que acontece na Amazônia há décadas.
Marcos afirmou que os índios têm seus direitos garantidos na Constituição Federal e espera que o parlamento rondoniense assuma a responsabilidade de garantir esses direitos aos povos indígenas. Disse que uma das soluções seria dar oportunidade par ao índio desenvolver a sua própria economia.
Adriano Karipuna, liderança jovem indígena de União Bandeirantes, disse que os poderes têm o dever de proteger as terras indígenas. As madeiras e tudo o que for apreendido e que tenha sido retirado das terras indígenas devem ser revertidos para os povos nativos.
Pediu maior destinação de recursos para atender aos povos indígenas e providências para que não mais se invadam as TI, especialmente pela descoberta de minérios em várias áreas.
Juripi Uru-eu-wau-wau, reforçou a questão das invasões e que já foi ameaçado por pessoas estranhas e pediu providências às autoridades.
Samuel Tupari, morador da terra indígena Rio Branco, em Alta Floresta, disse que os índios precisam ser mais ouvidos, respeitados e reconhecidos pela Casa de Leis para que o parlamento contribua com a solução dos inúmeros problemas que estão acontecendo nos territórios indígenas em todo o Estado. Denunciou casos de invasões e caciques que estariam sofrendo sérias ameaças feitas pelos invasores.
Ele disse que a fiscalização da Funai não está acontecendo como deveria e que a fundação deveria ouvir mais a voz da população indígenas ao invés de se manifestar apenas quando o índio erra. “Aí aparecem representantes querendo punir os indígenas”, declarou Samuel Tupari.
Ivan Kaxarari, disse que sofreram muito com invasores de madeireiros em terras do seu povo, especialmente pela Estrada do Boi, pois as terras cruzam a estrada e os fazendeiros já fizeram manejo desmatando e retirando madeira.
Celso Cinta Larga, afirmou ter vários problemas acontecendo na área das terras do povo Cinta Larga. Alertou as autoridades para que retirem garimpeiros das terras, pois sofrem ameaças e querem paz e sossego. “Precisamos do apoio do homem branco para resolver estes problemas, da Polícia Federal e das autoridades ao nosso lado. Chega de vivermos com medo. Lutamos pelo futuro do nosso povo e dos nossos filhos”.
Chaguinha Arara, de Ji-Paraná, pediu às autoridades melhorias na educação e saúde, abertura de estradas e que a Funai e de outros órgãos fiscalizadores maior atenção, pois estão retirando muita madeira das TI.
Rosana Puruburá, representante das mulheres guerreiras indígenas, disse que há uma inversão de valores, tendo em vista que são os outros que invadem as terras dos povos indígenas e nós e que somos ameaçados. “Não é possível viver assim, só lutamos pelos nossos direitos”.
Lino Sabanê relatou problemas na escola indígena e apoio aos professores que para lá se deslocam. Pediu apoio para infraestrutura em estradas e pontes. “Precisamos vender nossos produtos, mas sem acesso não é possível”.
Ivaneide Bandeira, da ONG Kanindé, fez várias denúncias de invasões não somente de madeireiros, mas de garimpeiros e que acabam por impactar em sua cultura. “Temos relatos de invasores que botaram a fiscalização pra correr, atirando nos fiscais do Ibama e Sedam”.
Esta situação acontece segundo Ivaneide, pois os invasores tem a certeza da impunidade e sabem que a Polícia Federal e outros órgãos não se unem para combater e expulsar estes invasores.
Laura Vicuña, coordenadora do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), disse que há 28 anos se promulgava a Constituição Federal, e cinco anos depois a Carta garantia que todas as terras indígenas deveriam ser demarcadas, porém segundo Laura, Rondônia hoje conta com 60 povos indígenas, mas apenas 20 possuem territórios com demarcação.
“E mesmo assim sofrendo algum tipo de invasão, lícita, feita por órgãos a exemplo do Programa Terra Legal, ou ilícita, através de garimpeiros, madeireiros, pescadores, colonos, grileiros, posseiros e fazendeiros”, declarou a coordenadora.
A indigenista Laura Vicuña afirmou que outras ações consideradas lícitas também provocam a vulnerabilidade das terras e citou como exemplo as rodovias que cortam os territórios indígenas, como a BR 429 e a BR 421, além da instalação de centrais hidrelétricas e a instalação de hotéis fazenda de propriedade de políticos que segundo ela, “se dizem representantes do Estado”.
Jandira Keppe, coordenadora do movimento indígena, afirmou que o dado novo é a venda de lotes dentro de áreas indígenas. Pessoas inescrupulosas promovem esta venda, afirmou. Quem irá perder é quem pensa que poderá utilizar esta terra, mas que terão de devolver. “É preciso investigação para saber quem está comercializando e quem está por trás destas vendas”.
Disse que fazendeiros estão aproveitando o manejo florestal nas proximidades das TI e “esquentam” a madeira extraída ilegalmente.
Para ela, outra ameaça aos povos indígenas é a PEC 215, vinda do Congresso Nacional, que entre outras coisas prevê transferência da demarcação das TI, que hoje é uma atribuição do executivo, para o legislativo. Também possibilita o arrendamento de TI, e isso vem contribuir para as invasões que tem ocorrido, afirmou.
Henrique Suruí agradeceu a oportunidade de poder reforçar o assunto referente à demarcação e a homologação de terra indígenas e destacou a dificuldade dos povos de sua origem conseguirem apoio para uma vida digna e sem preocupação.
Destacou a existência da exploração ilegal de madeiras nos territórios indígenas, porém disse que inserir a atuação de forças de segurança, como a Polícia Federal para solucionar o problema, poderia ser uma forma de gerar ainda mais conflito.
Walela Surui e Nathalia Apurinã leram carta de reivindicação e de fiscalização de terras indígenas, onde é pedida a retirada de grileiros e posseiros de todas as terras indígenas localizadas no Estado de Rondônia. Pediu compromisso da Assembleia, pedindo aos órgãos federais, para esta ação conjunta. Prevendo políticas públicas para os povos indígenas.

Mesa de debatedores
O representante indígena Almir Suruí, representando a Rede Sustentabilidade de Rondônia, disse que a questão indígena afeta a toda a sociedade e que através do diálogo se conseguirá preservar este patrimônio de toda a humanidade.
Heliton Gavião, coordenador dos povos indígenas de Rondônia (Copir), pediu a aprovação da Carta dos Povos Indígenas com a retirada urgente dos grileiros, invasores e madeireiros das TI e que o Estado brasileiro precisa dar mais vez e voz aos povos indígenas, consultando as comunidades antes da apresentação de qualquer projeto voltado para os povos indígenas.
Fez referência a duas hidroelétricas em áreas indígenas, uma no rio Branco e outro no Machado.
Vereador de Guajará-Mirim, Roberto Oro Win, disse que seu povo, que cuida da floresta, deseja o melhor para todos e não apenas para a população indígenas. Pediu que os 24 deputados estaduais e os oito deputados federais consigam uma emenda parlamentar para atender a agricultura indígena na aquisição de máquinas e utensílios agrícolas.
“Indígena não é preguiçoso, temos terras, mas precisamos de apoio para poder trabalhar”, declarou Roberto Oro Win.
O adjunto da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sedam), Francisco de Sales, disse que é preciso dar um basta nas invasões, cadastrando todas as terras e afirmou que o estado tem feito sua parte cumprindo todas as recomendações do Ministério Público, mas é preciso também o apoio de todas as instituições para garantir os direitos das gerações futuras. Ressaltou a necessidade de uma legislação federal para que também surta efeito em nível estadual.
Representando o Ibama, Edvar Sovete, relatou que nos 11 anos em que está no instituto participou e destacou várias ações relacionadas a terras indígenas. Disse não ver complicação em resolver o problema de furto de madeiras.
Segundo ele, basta não ter quem as compre, desta forma, não haverá motivos para a exploração e venda ilegal. Para ele, é preciso que o Estado reveja critérios mais específicos para a emissão de licença que autorize empresas atuar em áreas indígenas.
O Procurador-Chefe substituto do Ministério Público Federal, Reginaldo Trindade, alertou para a possibilidade de novas tragédias nas áreas indígenas devido as invasões ilegais. Comparou a situação dos Cinta Larga a um barril de pólvora, prestes a explodir. Por este motivo solicitou ações do governo federal.
Sobre os encaminhamentos afirmou que sua área de atuação é com o povo Cinta Larga, e pediu aprovação para as proposituras apresentadas por ele junto à mesa e que trata dos temas apresentados durante a audiência pública.
Política estadual de interesse dos povos indígenas, pois é necessário este instrumento para a Política Estadual Indigenista.
As cartas lidas pelas representantes indígenas devem ser encaminhadas aos órgãos competentes para que se consiga um compromisso mais efetivo. Sobre a provável construção das usinas hidroelétricas em área indígenas, propôs que a ALE encaminhe uma exortação ao governo federal para que não seja aprovado.
O secretário adjunto da Sesdec, cel. PM Adilson Pinheiro, afirmou que todos os órgãos podem sempre contar com a atuação das polícias Civil e Militar para as ações preventivas e repreensivas. É necessário uma rede de proteção, com inteligência, precisando saber quem são os responsáveis por estas invasões. Estratégia para inibir e diminuir as invasões.
Vicente Batista Filho, representante da regional da Funai em Ji-Paraná, informou que, após demonstrativos específicos dos territórios indígenas e de estudos demarcatórios foi possível concluir que outras várias regiões estão sendo devastadas e que também necessitam de um olhar do Poder Público. Quanto a exploração ilegal de madeira, disse que o Governo precisa se conscientizar de que a sua saída pode ser evitada com o envolvimento, atuação e fiscalização de outros órgãos estaduais, como o Detran, no que se resume ao tráfego de carretas e a Sedam, na questão de evitar planos de manejos em áreas indígenas.
Ton de Holanda, delegado representando o Ministério do Desenvolvimento Agrário, disse que enquanto deputado federal presidiu a Frente Parlamentar Indígena, onde disse ter constatado a dificuldade de entrada do índio no âmbito da política pública. Ton Holanda disse que o preconceito aos povos indígenas cresce cada dia mais e que os índios lutem para que a Constituição de 1988 não seja violada, pois é a única, das sete que o país já teve que reconhece os indígenas como povos originais do Brasil.

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