Cultura

 

Todos os povos, mesmo os mais primitivos, tiveram e têm uma cultura, transmitida no tempo, de geração a geração. Mitos, lendas, costumes, crenças religiosas, sistemas jurídicos e valores éticos refletem formas de agir, sentir e pensar de um povo e compõem seu patrimônio cultural.

Em antropologia, a palavra cultura tem muitas definições. Coube ao antropólogo inglês Edward Burnett Tylor, nos parágrafos iniciais de Primitive Culture (1871; A cultura primitiva) oferecer pela primeira vez uma definição formal e explícita do conceito: “Cultura … é o complexo no qual estão incluídos conhecimentos, crenças, artes, moral, leis, costumes e quaisquer outras aptidões e hábitos adquiridos pelo homem como membro da sociedade.”

Já o antropólogo americano Melville Jean Herskovits descreveu a cultura como a parte do ambiente feita pelo homem; Ralph Linton, como a herança cultural, e Robert Harry Lowie, como o conjunto da tradição social. No século XX, o antropólogo e biólogo social inglês Ashley Montagu a definiu como o modo particular como as pessoas se adaptam a seu ambiente. Nesse sentido, cultura é o modo de vida de um povo, o ambiente que um grupo de seres humanos, ocupando um território comum, criou na forma de idéias, instituições, linguagem, instrumentos, serviços e sentimentos.

Conceituação. A história da utilização antropológica do conceito de cultura tem origem nessa famosa definição de Tylor, que ensejou a oposição clássica entre natureza e cultura, na medida em que ele procurou definir as características diferenciadoras entre o homem e o animal a partir dos costumes, crenças e instituições, encarados como técnicas que possibilitam a vida social. Tal definição também marcou o início do uso inclusivo do termo, continuado dentro da tradição dos estudos antropológicos por Franz Boas e Bronislaw Malinowski, entre outros. Sobretudo na segunda metade do século XX, esse uso caracterizou-se pela ênfase dada à pluralidade de culturas locais, enfocadas como conjuntos organizados e em funcionamento, e pela perda de interesse na evolução dos costumes e instituições, preocupação dos antropólogos do século XIX.

Só o homem é portador de cultura; por isso, só ele a cria, a possui e a transmite. As sociedades animais e vegetais a desconhecem. É um complexo, porque forma um conjunto de elementos, inter-relacionados e interdependentes, que funcionam em harmonia na sociedade. Os hábitos, idéias, técnicas, compõem um conjunto, dentro do qual os diferentes membros de uma sociedade convivem e se relacionam. A organização da sociedade, como um elemento desse complexo, está relacionada com a organização econômica; os dois entre si relacionam-se igualmente com as idéias religiosas. O conjunto dessa inter-relação faz com que os membros de uma sociedade atuem em perfeita harmonia.

A cultura é uma herança que o homem recebe ao nascer. Desde o momento em que é posta no mundo, a criança começa a receber uma série de influências do grupo em que nasceu: as maneiras de alimentar-se, o vestuário, a cama ou a rede para dormir, a língua falada, a identificação de um pai e de uma mãe, e assim por diante. À proporção que vai crescendo, recebe novas influências desse mesmo grupo, de modo a integrá-la na sociedade, da qual participa como uma personalidade em função do papel que nela exerce. Se individualmente o homem age como reflexo de sua sociedade, faz aquilo que é normal e constante nessa sociedade. Quanto mais nela se integra, mais adquire novos hábitos, capazes de fazer com que se considere um membro dessa sociedade, agindo de acordo com padrões estabelecidos. Esses padrões são justamente a cultura da sociedade em que vive.

A herança cultural não se confunde, porém, com a herança biológica. O homem ao nascer recebe essas duas heranças: a herança cultural lhe transmite hábitos e costumes, ao passo que a herança biológica lhe transmite as características físicas ou genéticas de seu grupo humano. Se uma criança, nascida numa sociedade bororo, é levada para o Rio de Janeiro, passando a ser criada por uma família de Copacabana, crescerá com todas as características físicas — cor da pele e do cabelo, forma do rosto, em especial os olhos amendoados — de seu grupo bororo. Todavia, adquirirá hábitos, costumes, a língua, as idéias, modos de agir da sociedade carioca, em que se cria e vive.

Além desses hábitos e costumes que recebe de seu grupo, o homem vai ampliando seus horizontes, e passa a ter novos contatos: contatos com grupos diferentes em hábitos, costumes ou língua, os quais farão com que adquira alguns desses hábitos, ou costumes, ou modos de agir. Trata-se da aquisição pelo contato. Foi o que se verificou no Brasil do século XIX com hábitos introduzidos pelos imigrantes alemães ou italianos; o mesmo sucedeu em séculos anteriores, com costumes introduzidos pelos negros escravos trazidos da África. Tais costumes vão-se incorporando à sociedade e, com o tempo, são transmitidos como herança do próprio grupo.

É certo que essa transmissão pelo contato não abrange toda a cultura do outro grupo. Somente alguns traços se transmitem e se incorporam à cultura receptora. Esta, por sua vez, se torna também doadora em relação à cultura introduzida, que incorpora a seus padrões hábitos ou costumes que até então lhe eram estranhos. É o processo de transculturação, ou seja, a troca recíproca de valores culturais, pois em todo contato de cultura as sociedades são ao mesmo tempo doadoras e receptoras. Dessa forma, o homem adquire novos elementos culturais, e enriquece seu tipo cultural.

Esses elementos, que compõem o conceito de cultura, permitem mostrar que ela está ligada à vida do homem, de um lado, e, de outro, se encontra em estado dinâmico, não sendo estática sua permanência no grupo. A cultura se aperfeiçoa, se desenvolve, se modifica, continuamente, nem sempre de maneira perceptível pelos membros do próprio grupo. É justamente isso que contribui para seu enriquecimento constante, por meio de novas criações da própria sociedade e ainda do que é adquirido de outros grupos.

Graças às pesquisas em jazidas arqueológicas, tem sido possível recompor ou reconstruir as culturas, o que permite conhecer o desenvolvimento cultural do homem, sobretudo no campo material. É mais difícil, porém, conhecer o desenvolvimento da cultura espiritual, embora muita coisa já se tenha podido esclarecer. De qualquer forma o que se sabe é que, nascida com o homem, a cultura, sofreu modificações ao longo dos tempos, enriquecendo-se de novos elementos e adquirindo novos valores. A cultura acompanha, pois, a marcha da humanidade; está ligada à vida do homem, desde o ser mais antigo. Com a expansão do homem pela Terra, ocupando os grupos humanos novos meios ambientes, a cultura se ampliou e se diversificou em face das influências impostas pelo meio, cujas relações com o homem condicionaram o aparecimento de novos valores culturais ou o desaparecimento de outros.

Sentidos de cultura. Assim, dentro do conceito geral de cultura, é possível falar de culturas e, por isso, se identificam sentidos específicos segundo os quais a cultura é antropologicamente considerada. São quatro, a saber: (1) a cultura entendida como modos de vida comuns a toda a humanidade; (2) a cultura entendida como modos de vida peculiares a um grupo de sociedades com maior ou menor grau de interação; (3) a cultura entendida como padrões de comportamento peculiares a uma dada sociedade; (4) a cultura entendida como modos especiais de comportamento de segmentos de uma sociedade complexa.

O primeiro sentido apresenta aqueles elementos de cultura comuns a todos os seres humanos, como a linguagem (todos os homens falam, embora se diversifiquem os idiomas ou línguas faladas). São aqueles hábitos — o de dormir, o de comer, o de ter uma atividade econômica — que se tornam comuns a toda a humanidade.

No segundo sentido, encontram-se os elementos comuns a um grupo de sociedades, como o vestuário chamado ocidental, que é comum a franceses, a portugueses, a ingleses. São diversas sociedades que têm o mesmo elemento cultural; um exemplo é o uso do inglês por habitantes da Inglaterra, da Austrália, da África do Sul, dos Estados Unidos, que, entre si, entretanto, têm valores culturais diferentes.

O terceiro sentido é formado pelo conjunto de padrões de determinada sociedade, por exemplo, aqueles padrões culturais que caracterizam o comportamento da sociedade do Rio de Janeiro; ou as peculiaridades que assinalam os habitantes dos Estados Unidos.

O quarto sentido de cultura refere-se a de modos especiais de comportamento de um segmento de sociedade mais complexa. Uma dada sociedade possui valores culturais comuns a todos os seus integrantes. Dentro, porém, dessa sociedade encontram-se elementos culturais restritos ou específicos de determinados grupos que a integram. São certos costumes que, dentro da sociedade multíplice do Rio de Janeiro, apresentam os habitantes de Copacabana, os de uma favela ou de um subúrbio distante. A esses segmentos culturais de uma sociedade complexa, dá-se também o nome de subcultura.

São esses sentidos que permitem verificar a diferenciação de cultura entre os diversos grupos humanos. Tal diferenciação resulta de processos internos ou externos, uns e outros atuando de maneira diversa sobre o fenômeno cultural. Entre os processos internos, encontram-se as inovações, traduzidas em descobertas e invenções, que, às vezes, surgem em determinado grupo e depois se transmitem a outros grupos, não raro sofrendo modificações ao serem aceitas pela nova sociedade. Os processos externos explicam-se pela difusão: é a transmigração de um elemento cultural de uma sociedade a outra. Em alguns casos o elemento cultural mantém a mesma forma e função; em outros, modifica-as ou mantém apenas a forma e modifica a função.

A caracterização de Herskovits. Todos esses aspectos relacionados com o processo cultural de uma sociedade podem ser analisados à base de alguns princípios. De acordo com a caracterização de Melville Herskovits, a cultura deriva de componentes da existência humana, é aprendida, estruturada, formada de elementos, dinâmica, variável, cumulativa, contínua e um instrumento de adaptação do homem ao ambiente.

A cultura é derivada de componentes da existência humana, ou seja, origina-se de fatores ligados ao homem. São fatores ambientais, psicológicos, sociológicos e históricos, que contribuem para compor a cultura dentro de uma sociedade estudada. Ela é também aprendida, porque se verifica um processo de transmissão dos mais velhos — pessoas ou instituições — aos mais novos, à proporção que estes se vão incorporando a sua sociedade. São as chamadas linhas de transmissão, isto é, aqueles meios pelos quais se verifica a aprendizagem da cultura. A família, os companheiros de trabalho, os professores, o esporte, a igreja, a escola, são linhas de transmissão, ou seja, transmitem a cultura, que se torna assim aprendida pelos que se incorporam à sociedade.

Do mesmo modo, a cultura é estruturada, pois tem uma forma ou estrutura que lhe dá estabilidade no respectivo grupo humano, sem prejuízo das possibilidades de mudança, que são imensas. É estruturada no sentido de que, compondo-se de diversos valores, mantém entre eles uma estruturação orgânica.

Constituída de diferentes valores, a cultura forma os complexos que, unidos e inter-relacionados, dão o padrão cultural. A organização social, a língua usada, a organização política, a estética, as idéias religiosas, as técnicas, o sistema de ensino são alguns dos elementos existentes em uma sociedade. Esses elementos dão forma à cultura e a representam, em conjunto, de maneira a caracterizar a sociedade em que se manifestam. Não são iguais, porém, em todas as sociedades; daí a cultura ser variável. A cultura é também cumulativa; vão-se acumulando nela, em face da respectiva sociedade, os elementos vindos de gerações anteriores, sem prejuízo das mudanças que se podem verificar no decorrer do tempo.

Cada geração humana, em determinada sociedade, recebe os elementos vindos de seus antepassados, e ao mesmo tempo vai acolhendo novos elementos que se juntam àqueles. Por isso mesmo, a cultura é também contínua: vai além do indivíduo ou de uma geração, pois continua, mesmo modificada, mas sem interromper sua permanência na sociedade a que pertence. É o continuum cultural que liga cada sociedade a suas raízes mais antigas. Se alguns valores se alteram, desaparecem e são substituídos por novos, outros se mantêm constantes, vivos, geração após geração. Essa continuidade cultural dá à sociedade sua estabilidade, pois apesar das revoluções, invasões, novos contatos com grupos diferentes, o fato é que a cultura permanece, e a sociedade prossegue em sua existência.

Por fim, a cultura é um instrumento de adaptação do homem ao ambiente. É pelos valores culturais que o homem se integra a seu meio. Primeiro, como indivíduo. Ao transformar-se em personalidade que se incorpora a seu grupo, vai adquirindo os hábitos, os usos e os costumes da sociedade a que pertence, de forma a adaptar-se inteiramente a ela. Aprende a língua que deve ser falada; adquire as noções de relações com os companheiros; aprende os mesmos jogos infantis e as mesmas atividades juvenis; adquire uma profissão que atende aos interesses da sociedade. Em segundo lugar, cria instrumentos ou concebe novas idéias, que o capacitam a melhor adaptar-se ao ambiente.

Classificações da cultura. Apesar de formar uma unidade devidamente estruturada, cumulativa e contínua, a cultura pode ser dividida. É o que se chama de classificação de cultura, isto é, a divisão dos valores culturais exclusivamente por necessidade metodológica, ou para fins pedagógicos ou didáticos. Os elementos que integram uma cultura não dominam uns aos outros; unem-se e ajudam a compreender a cultura e seu funcionamento. A classificação ou divisão da cultura é apenas uma necessidade que têm os estudiosos para melhor apreciar os diferentes aspectos dessa cultura. Daí a própria variação dessas classificações ou divisões, em geral conforme as preferências ou pontos de vista em que se coloca cada autor.

A mais antiga classificação se deve ao sociólogo americano William Fielding Ogburn, que em Social Change: With Respect to Culture and Original Nature (1922; Mudança social: referida à cultura e natureza original) dividiu a cultura em material e não-material ou espiritual. A primeira compreenderia todos os elementos capazes de uma representação objetiva, em um objeto ou fato. A segunda seria tudo o que é criado pelo homem, como concepção ou idéia, nem sempre traduzido em objetos ou fatos.

Outras classificações podem ainda ser lembradas. Ralph Linton, baseando-se na constatação de que os fatos culturais resultam das necessidades humanas, dividiu a cultura em: necessidades biológicas, agrupando todos os fatos que correspondem à vida física do homem (alimentação, habitação, vestuário etc.); necessidades sociais, em que se reúnem todos os fatos relacionados com a vida em sociedade (organização social, organização política, ensino etc.); e necessidades psíquicas, que compreendem todos os fatos que representam manifestações de pensamento dos seres humanos (crenças, estética etc.). Melville Herskovits ofereceu a seguinte distribuição dos elementos culturais: cultura material e suas sanções; instituições sociais; homem e universo; estética, linguagem.

Pode-se ainda assinalar a classificação dos elementos culturais, tendo em vista os sistemas operacionais de ação do homem: sistema ou nível adaptativo, em que se verificam as relações do homem com o meio (ecologia, tecnologia, economia); sistema ou nível associativo, em que se estudam as relações dos homens entre si (organização social, família, parentesco, organização política); e sistema ou nível ideológico, onde se compreendem os produtos mentais resultantes de relações entre os homens e as idéias ou concepções (saber, crenças, linguagem, arte etc.).

Uma última observação deve ser feita, em face da aplicação do sentido de cultura: é que muitas vezes se tem confundido, na linguagem menos científica, o sentido de cultura com o de raça ou de língua. Falar-se, por exemplo, de uma raça ariana é um engano, pois o que existe são povos que falaram originariamente as línguas indo-européias ou arianas, tronco de onde nasceram as modernas línguas faladas na Europa contemporânea. Da mesma forma é um engano falar-se de raça judaica, pois o que existe são elementos humanos, que se aglutinam pela cultura, em particular pelos mesmos ideais ou sentimentos religiosos, e nunca pelas mesmas características físicas.

Convém salientar que as três variáveis — cultura, raça e língua — são independentes e não seguem a mesma direção. Encontram-se casos em que persistem as características raciais e se modificam as lingüísticas e culturais, como se verificou com os negros da África e na América do Norte ou com os vedas do Ceilão (hoje Sri Lanka). Em outras ocasiões, persistem as características lingüísticas e modificam-se as raciais; foi o que sucedeu com os magiares na Europa, vindos de um mesmo tronco lingüístico, mas de variada formação racial. Pode também suceder a persistência de características culturais e a modificação das características físicas ou lingüísticas. É o exemplo encontrado nos povos chamados latinos. Com tais exemplos, conclui-se que cultura não se confunde com raça ou língua.

Padrão cultural. Em antropologia, a expressão padrão cultural se refere à soma total das atividades — atos, idéias, objetos — de um grupo; ao ajustamento dos diversos traços e complexos de uma sociedade. É aquela configuração exterior que uma cultura apresenta, traduzindo o conjunto de valores que expressa essa mesma cultura.

A idéia desse conceito começou a formar-se com o antropólogo americano Franz Boas, que em 1910 afirmou a individualidade da cultura em cada tribo indígena americana por ele estudada. Essa observação decorreu da presença de certos elementos que distinguem determinada cultura. No caso dos grupos estudados, Boas mencionou o conservantismo dos esquimós, sua capacidade de invenção, sua boa índole, seu conceito peculiar da natureza e outros aspectos. Tais elementos não são conseqüência de simples difusão: resultam, em grande parte, de seu próprio método de vida; e o esquimó mesmo vai remodelando os elementos obtidos de outros grupos, de acordo com os padrões dominantes em seu meio.

A idéia de padrão, em seu sentido antropológico, somente se formulou, no entanto, com a antropóloga americana Ruth Benedict, em sua obra clássica Patterns of culture (1934; Padrões culturais). Estudando as diferentes características das culturas tribais, ela ressaltou que existe um padrão psicológico modelador dos elementos culturais emprestados. Por sua vez, esse mesmo padrão afasta aqueles elementos culturais que a ele não se conformam. A cultura é como o indivíduo, e tem um padrão mais ou menos consistente em seu pensamento e ação. Benedict analisa as culturas dos índios zunis, indicando os padrões culturais de cada um desses grupos, para mostrar o que os caracteriza. Admite, igualmente, uma influência da psicologia gestaltista, que lhe permitiu demonstrar a importância de tratar o todo em lugar das partes e provar que nenhuma análise das percepções separadas pode explicar a experiência total.

Por meio dos três grupos tribais estudados na obra, Ruth Benedict procura explicar, e não apenas expor, as características que cada um apresenta em seu padrão cultural. Apesar da ampla difusão de sua obra e da imensa aceitação de seu conceito de padrão cultural, não se podem negar as críticas feitas a seu método de estudo, traduzidas principalmente nas observações de Robert Lowie; a este se afigurava que o desejo de distinguir um padrão de outro conduz necessariamente a uma tendência de sobreestimar diferenças. Dessa forma podem produzir-se sérias alterações em virtude de uma seleção subjetiva dos critérios. Enfim, a Lowie parecia que se deveriam esperar investigações ulteriores para chegar a uma definição adequada do conceito de padrão.

Escola histórico-cultural. Corrente etnológica que procura explicar o desenvolvimento cultural como processo de difusão, a escola histórico-cultural teve seus primeiros idealizadores na Áustria e na Alemanha, donde o nome com que é também conhecida: escola austro-alemã. O antropólogo e arqueólogo alemão Leo Frobenius é um de seus primeiros nomes. A ele se deve a idéia dos ciclos culturais, de que a constância na associação dos elementos culturais determina a formação de um ciclo — um conjunto de determinados valores culturais partidos de um ponto único dentro da área ocupada. A área ocupada por esses valores de cultura é o círculo cultural.

Ao mesmo tempo que Frobenius aplicava essa teoria aos povos africanos, o etnólogo Fritz Graebner, em Berlim, estudava, dentro do mesmo critério, os povos da Oceania. Começaram então a surgir as bases dessa nova teoria antropológica, especificamente etnológica, repercutindo sobretudo em Viena, onde o padre Wilhelm Schmidt estudou também a distribuição dos grupos humanos em ciclos culturais. Viena e Berlim tornaram-se os centros fundamentais da formação e desenvolvimento dessa escola, cujos princípios metodológicos estão sistematizados por Graebner, em livro publicado na primeira década deste século, sob o título Methode der Ethnologie (1911; Metodologia etnológica). Também Schmidt publicou um livro com os fundamentos metodológicos da escola histórico-cultural.

Os estudos de Wilhelm Schmidt nem sempre concordaram plenamente com os de Graebner. Surgiram, entre os dois, certas divergências de detalhes que não invalidam, entretanto, o conjunto. Além dos critérios de Graebner, que são o de forma e o de qualidade, Schmidt estabeleceu o princípio de causalidade cultural, quer dizer, apontou a existência de causas externas e internas que incidem na formação da cultura. As causas externas são as que, de fora, influem sobre o homem, tais como as forças físicas e a própria atividade do homem; as causas internas são as vindas de dentro, do próprio grupo, de natureza instintiva. São causas que nem sempre podem observar-se, salvo quando se traduzem em formas concretas.

Uma das divergências entre Graebner e Schmidt era o estabelecimento dos ciclos culturais. Enquanto Graebner considerava os tasmanianos como o povo mais primitivo, Schmidt assim considerava os pigmeus da floresta da África. Ora, um ciclo de cultura caracteriza-se pelo conjunto dos valores culturais existentes naquele grupo, e pode não ter continuidade geográfica. Chegou-se, pois, à evidência de que nem os tasmanianos são mais primitivos que os pigmeus africanos, nem estes mais que aqueles. Cientificamente colocam-se num mesmo plano e, assim, dentro de um mesmo ciclo.

O círculo cultural, além de caracterizar uma distribuição geográfica, considera ainda a história do desenvolvimento cultural e estuda a estratificação dos elementos existentes. Nisso diverge do conceito, mais moderno, de área cultural, que considera territorialmente a existência dos elementos culturais em face de semelhança de cultura material e de condições geográficas. Não considera como importante a reconstituição histórica dos elementos. Baseia-se essencialmente em sua localização. O conceito de área cultural foi um dos traços de diversificação e divergência da escola americana, liderada por Franz Boas, em face da escola histórico-cultural, da qual se originou.

www.enciclopediaescolar.hpg.com.br

A sua enciclopédia na internet.

Download (DOCX, 19KB)

 

Latest articles

Previous article
Next article

Trabalhos Relacionados