Como é feito o processamento da cana-de-açúcar nas usinas

 

A tecnologia de produção de etanol e açúcar é muito semelhante, do ponto de vista de processos, em todas as usinas brasileiras; há variações nos tipos e qualidades dos equipamentos, controles operacionais e, principalmente, nos níveis gerenciais. Existe, atualmente, uma boa integração entre as áreas agrícola e industrial das usinas, o que permite otimizar toda a cadeia produtiva nas unidades mais bem gerenciadas. O sistema de pagamento de cana em uso estimula o produtor independente de cana a entregar a matéria-prima em boas condições, pois há penalidades ou prêmios dependendo da qualidade da cana entregue na usina. Com efeito, ele leva em conta incentivos pelo maior teor de sacarose na cana e deságios pela matéria estranha mineral e os açúcares redutores presentes (ref. Antônio Carlos Fernandes).

A unidade industrial pode ser dividida nas seguintes seções, que serão descritas a seguir: recepção/preparo/moagem, tratamento do caldo, fábrica de açúcar, destilaria de etanol, utilidades, disposição de efluentes e estocagem dos produtos. A Figura 3-1 mostra um diagrama de blocos do processamento da cana.

Processamento da cana para a produção conjunta de açúcar e etanol Processamento da cana para a produção conjunta de açúcar e etanol.

Recepção, preparo e moagem da cana na usina

Esta seção da fábrica tem a finalidade de condicionar a cana (limpeza e abertura das células) e extrair o caldo com um mínimo de perda de açúcares da cana, bem como reduzir a umidade final do bagaço. A cana recebida é amostrada aleatoriamente para se aferir sua qualidade (teor de sacarose, fibra, pureza do caldo, etc.).

A cana colhida inteira (corte manual) é normalmente lavada para diminuir as impurezas (que afetam negativamente o processamento da cana) na própria mesa de recepção da cana; no caso de cana picada (corte mecanizado), a cana não pode ser lavada, pois as perdas de sacarose seriam muito elevadas, por isso algumas usinas estão começando a utilizar o sistema de limpeza a seco, baseado em jatos de ar sobre a cana.

Da mesa de alimentação, a cana é transportada por esteiras até os equipamentos de preparo; normalmente existe um ou dois conjuntos de facas rotativas, que tem a finalidade de picar a cana (quando inteira) e/ou nivelar a camada de cana na esteira, facilitando o trabalho do desfibrador. Este equipamento, composto de um rotor com martelos oscilantes e uma placa desfibradora, pulveriza a cana e abre as células que contêm os açúcares, facilitando o processo de extração desses açúcares pela moenda (pelo menos 82% das células devem estar abertas para se conseguir uma boa eficiência de extração nas moendas).

Na saída do desfibrador, a altura do colchão de cana é uniformizada por equipamento denominado espalhador, localizado na descarga da esteira metálica, para uma esteira de borracha de alta velocidade e que alimenta a calha de alimentação forçada da moenda (chute Donnely); dentro desta calha, a cana desfibrada forma uma coluna com maior densidade, aumentando a alimentação e capacidade da moenda. O nível da cana dentro da calha é utilizado para controlar o fluxo de cana para a moenda.

A extração dos açúcares contidos na cana pode ser feita por dois processos: moagem e difusão; o processo de difusão é pouco utilizado no Brasil e, portanto, não será descrito.

A moagem é um processo de extração do caldo que consiste em fazer a cana passar entre dois rolos, com uma pressão pré-estabelecida aplicada a eles. A moenda deve extrair o caldo, como também produzir bagaço, no final do processo, com um grau de umidade que permita sua utilização como combustível nas caldeiras. A moenda é normalmente formada por quatro a sete ternos em série. Após a passagem pelo primeiro destes ternos, a proporção de caldo em relação à fibra cai de aproximadamente sete para algo entre 2 a 2,5, ficando difícil extrair este caldo residual; o artifício usado é o que se chama de embebição. A embebição pode ser simples, composta e com recirculação, sendo o tipo composta o mais usado. Neste caso, água é injetada na camada de cana entre os dois últimos ternos e o caldo de cada terno é injetado antes do terno anterior até o segundo terno. Normalmente, o caldo extraído no primeiro terno é enviado para a fábrica de açúcar (por ser de melhor qualidade) e o restante do caldo vai para a destilaria. A eficiência de extração de açúcares varia de 94,0% a 97,5% e a umidade final do bagaço é em torno de 50%.

Estocagem do bagaço

Após a extração do caldo, o bagaço, constituído de fibra (46%), água (50%) e sólidos dissolvidos (4%), é transportado por esteiras rolantes para as caldeiras, sendo o excedente enviado ao pátio de estocagem. O bagaço é produzido numa quantidade que varia de 240kg a 280kg por tonelada de cana moída; ele se constitui no único combustível utilizado nas caldeiras a vapor, gerando toda energia necessária ao processamento de cana e, ainda, produzindo uma sobra que varia, na maioria dos casos, entre zero e 10%.

Atualmente, na maioria das usinas, o vapor sai das caldeiras na pressão de 22bar e temperatura de 300°C; nessas condições, ele é expandido em turbinas de contrapressão até 2,5bar, turbinas estas que acionam os principais equipamentos mecânicos da usina (picadores, desfibradores, moendas, exaustores e bombas de água de alimentação das caldeiras), bem como os geradores de energia elétrica, que é fornecida para os vários setores da indústria. O vapor a 2,5bar, denominado de vapor de escape, é ajustado para a condição de saturação e enviado para o processo, fornecendo toda a energia térmica necessária na produção de açúcar e etanol.

Tratamento do caldo

O caldo de cana, quando sai do processo de extração, contém uma quantidade de impurezas que tem de ser reduzida para deixá-lo numa qualidade adequada para seu processamento na fábrica de açúcar e na destilaria. A primeira fase do tratamento é destinada à remoção, por meio de peneiras, dos sólidos insolúveis (areia, argila, bagacilho, etc.), cujos teores variam entre 0,1% e 1,0%. A segunda fase é o tratamento químico, cujo objetivo é remover as impurezas insolúveis que não foram eliminadas na fase anterior e as impurezas coloidais e solúveis; este processo visa à coagulação, floculação e precipitação destas impurezas, que são eliminadas por sedimentação. É necessário, ainda, fazer a correção do pH para evitar inversão e decomposição da sacarose.

O caldo tratado pode ser enviado à fabricação de açúcar ou de etanol. Na fabricação do açúcar, é obrigatória a etapa de sulfitação, que tem como objetivos principais inibir reações que causam formação de cor, coagulação de coloides solúveis, e formação do precipitado CaSO3 (sulfito de cálcio) e diminuir a viscosidade do caldo e do xarope, massas cozidas e méis, facilitando as operações de evaporação e cozimento.

Após passar pelo tratamento inicial, o caldo deverá passar pela pasteurização com aquecimento e resfriamento imediato. Um tratamento mais completo do caldo implica adição de cal, aquecimento e posterior decantação, tratamento semelhante ao utilizado na fabricação de açúcar.

Em geral, o resfriamento do caldo é realizado em duas etapas:

  1. Fazendo-se passar o caldo quente por um trocador de calor regenerativo em contracorrente com o caldo misto frio, onde o caldo misto é aquecido e o caldo para destilaria é resfriado (60°C);
  2. Resfriamento final até aproximadamente 30°C, normalmente realizado em trocadores de placas utilizando água, em contracorrente como fluido de resfriamento.

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