As raizes medievais da europa

 

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Escrito por Jacques Le Goff, As raízes medievais da Europa (Editora Vozes. 2007) é uma ilustração detalhada do aparecimento e desenvolvimento, a qual traça, a infância e juventude da Europa tendo marco de inicio a Idade Média.

Ao atentarmos nossa atenção ainda mais para o titulo da obra veremos que raízes concorrem com o mesmo sentindo de gênesis, o inicio, pressupondo que a Idade Média seria a mãe e o pai da Europa e que as transformações ocorridas no ocidente medieval refletem ainda mais a identidade européia, ao mesmo tempo, logo em seu prelúdio, o autor nos coloca a Idade Media como uma transportadora das heranças clássicas do antecedente europeu: a herança grega, a romana, e a herança bíblica que não fora transmitida pelos judeus e sim pelos primeiros cristãos. Le Goff não trata a passagem do império romano para o período medieval como um acontecimento catastrófico, ele coloca essa transição como um processo de uma evolução gradual a qual lentamente começa surgir a Europa propriamente dita, onde se destaca o cristianismo como elemento fundamental norteador de uma cultura européia, percebendo a cristianização herdada do Império Romano tornando religião oficial em 380, ao comando do imperador Teodósio, faz com que a Idade Media torne-se caracterizada pela fé em Cristo e pelo controle da Igreja. Neste momento a personagem de Santo Agostinho ganha destaque no desenvolvimento do cristianismo. Ele defendeu a ortodoxia cristã em debates teológicos terríveis com hereges, nas controvérsias donatista. (SPROUL, 2002:59).

Agostinho conseguiu fazer uma síntese filosófica entre platonismo e cristianismo, porém sua obra não evidencia um sistema como tal. Suas reflexões sobre as áreas fundamentais da epistemologia, da criação do problema do mal e da natureza do livre-arbítrio são de importância permanente. Ele influenciou o desenvolvimento da doutrina da igreja da doutrina da trindade e da doutrina da graça combatendo todas as formas de ceticismo procurando estabelecer um fundamento para a verdade, Le Goff cita algumas obras mais importantes do filosofo padre, Confissões. Cidade de Deus e Cidade dos anjos, obras estas que fundamentaram para Idade Media uma regra monástica e racionaliza pela primeira vez a fé cristã.Com uma leitura mais apurada e detalhada da obra nos deparamos com um pequeno equivoco do autor ou um equivoco da editora. No capitulo I com o subtítulo Invasões e aculturação, no terceiro parágrafo, precisamente na página 39 encontramos o seguinte enunciado: “Depois da morte de Moisés em 632, os árabes e os convertidos ao Islã, os mulçumanos conquistaram de maneira fulminante a península arábica, (…)”. Neste capitulo o autor destaca a grande onda de acontecimentos ocorridos a partir do século III e chega até a invasão dos mulçumanos na Europa, aqui compreendemos melhor o equivoco, a personagem histórica destacada acima não seria a figura de Moisés e sim Maomé que tem sua data de morte em 632, evidentemente Moisés, o líder escolhido por Deus para libertar os israelitas da escravidão do Egito, é uma figura datada do período anterior a cristo. Além disso, logo após a morte do profeta Maomé a expansão continuou em duas direções. Uma delas voltada para o Oriente Médio, Pérsia e Índia e outra para o Norte da África. No ano de 711 os muçulmanos atravessaram o estreito que liga a África à Espanha. Em pouco tempo quase toda a Península Ibérica estava sobre o controle muçulmano, exceto uma pequena faixa de terra ao norte.

A construção da Europa ou tentativa de construção da Europa está às mãos de Carlos magno que assumiu o trono e por suas realizações é considerado como o mais importante dos reis francos, organizou um exercito forte, do qual faziam parte os grandes proprietários de terra, entretanto seu governo não tinha sede fixa às decisões mais impotentes politicamente eram tomadas no palácio de Aix-la-Chapelle, no noroeste da frança. Após a coroação de Carlos Magno a Imperador, a Igreja pretendia fazer reviver o Império Romano do Ocidente sob o comando de um monarca cristão. Ainda com sua pouca instrução o imperador fundou ao lado de cada igreja, escolas gratuitas para a população e nos mosteiros escolas para os sacerdotes abrindo também no próprio palácio uma escola que era freqüentada sem distinção de tratamento por meninas e meninos de famílias pobres e de nobres.
O plano político-administrativo e jurídico Carlos Magno assumiu o controle dos tribunais, padronizou o sistema de moedas e passou a fazer uso crescente dos documentos escritos. Seus administradores escolhidos geralmente entre a nobreza local eram escolhidos como marqueses e a outra categoria de nobres da confiança do imperador e os duques. Cada um deles tinha o poder de convocar e comandar pose exércitos de vários condados, com essa estrutura administrativa, Carlos Magno mantinha controle sobre todo o império, também procurava governar a Igreja exercendo autoridade sobre o papa: era ele quem praticamente escolhia os bispos e os empregava como simples funcionários do Estado. Neste ponto de vista, o Império Carolíngio nos parecerá um esforço notável. Mas em ultima analise falho. (LE GOFF. 2007: 54).
A projeção do culto mariano é um grande cargo de destaque na Idade Média. Segundo o autor este movimento começa a ganhar espaço no século XI nas crenças e nas praticas do ocidente cristão. Parece-me que nestas condições a Virgem alcança um status superior excepcional. Vejo nela uma espécie de quarta pessoa da trindade (LE GOFF. 2007; 113).O culto a Virgem Maria está associado à defesa da virgindade. Relativamente a Maria, tanto Oriente como Ocidente celebram-na como festa da nova Eva, virgem obediente e fiel que se torna por obra do Espírito Santo, Mãe de Deus, mas também verdadeira Mãe dos vivos, verdadeira Arca da aliança e verdadeiro Templo de Deus; memória de um momento culminante do dialogo de salvação entre Deus e o homem e, comemoração do livre consentimento da Virgem e do seu concurso no plano de redenção. (FLORES. 2006; 125), com a maior aceitação do mistério cristão as leituras feitas do antigo e novo testamento buscam ainda mais a evidência da virgem Maria como agente e testemunha singular da encarnação expandindo o intimo em expressões de glorificação a Deus, de humildade, fé, esperança, no qual ressoa profeticamente antecipada, a voz da Igreja.

Ao analisar o culto a Maria o autor nos prende em uma intrigante questão, se o reverenciado culto a virgem modificou a condição terrena da mulher? Para o mesmo, a imagem da virgem torna-se como salvadora e redentora dos pecados, contrário a Eva a qual se tornou responsável pela entrada do pecado no mundo muito distante do ideal da Virgem, criada pela Igreja, considerada a agente de Satã, responsável pela desgraça do homem, e por desviá-lo do caminho da salvação.
A perseguição aos judeus contada pelo autor foi a mais duradoura e mais abominável, responsabilizados pela morte de Cristo, eles foram acusados de dissídio e se tornaram objeto de desconfiança, inveja, desprezo dos cristãos. O anti-semitismo tomou uma dimensão sem precedentes. Muitas restrições lhes foram impostas. Existiram tributos específicos para eles. Eram proibidos de casar com cristãos e não podiam ter escravos ou empregados cristãos, ocupar cargos públicos, nem legar heranças ou construir sinagogas. Estavam sempre se defrontando com o dilema de escolher entre o batismo ou a morte. Rejeitados pelos cristãos, os judeus se recusavam a manter, com aqueles, uma vida em comum. O comportamento dos judeus produzia desconfiança e medo: eles se escondiam em ritos misteriosos, conservavam um estranho idioma, permaneciam apartados e formavam um grupo fechado. Os judeus acreditavam no Antigo Testamento e renegavam o Novo, que, segundo os cristãos, era o desfecho e a explicação do Antigo. Aos olhos da cristandade, constituíam mau exemplo para todos, principalmente para os pagãos que os cristãos buscavam atrair.

A partir do final do século XI, atendendo ao chamado da Igreja e alegando cumprir a vontade divina, grupos de peregrinos e soldados assolaram o norte da Europa, a caminho do Oriente, obrigando comunidades inteiras de judeus a escolher entre a morte e a conversão. Assassinatos em massa, em Worms, Neuss, Trier e outras localidades, respondiam às acusações de que judeus inimigos da fé matavam crianças. Milhões de judeus foram vítimas da ação dos cruzados. Na primeira cruzada, sofreram perseguições e foram submetidos a batismos forçados. O isolamento dos judeus, que os tornava cada vez mais vulneráveis as perseguições (…), ( LE GOFF.2007;128).
Além do mais o autor fala do movimento das cruzadas onde o crescimento populacional levou à ocupação de áreas ainda não utilizadas para plantio, como florestas e pântanos. Entretanto, a disponibilidade de terras nessas áreas era limitada. Além disso, a população se expandia em ritmo mais acelerado do que a produção. Dessa forma, crescia o número de pessoas que caíam na mendicância ou banditismo.
Ao mesmo tempo, os senhores feudais ampliaram as obrigações dos servos, o que levaram muitos destes a abandonar as terras em que viviam ou a serem expulsos delas. Tal situação começou a colocar em crise as relações servis que sustentavam a economia feudal. A crise atingiu não só os camponeses, mas também os nobres, que, para não fragmentar seus domínios, passaram a fazer uso do direito de primogenitura, pelo qual apenas o filho mais velho poderia herdar o feudo. Com isso, os filhos mais novos eram obrigados a procurar outros meios de sobrevivência. Jovens cavaleiros saíam então pelo mundo em busca de oportunidades: um casamento vantajoso, o seqüestro de alguém da alta nobreza para cobrar resgate. Tais condições, somadas ao espírito de aventura dos cavaleiros e às disputas territoriais, propiciaram um clima de constantes lutas entre a nobreza. Na tentativa de controlar a situação, no início d século XI o papa proclamou a Paz de Deus, pela qual os combates foram limitados a noventa dias por ano. Foi meio a essa situação que o papa Urbano II lançou seu apelo à cristandade, dando início às Cruzadas.
O saldo das Cruzadas para o Ocidente não foi tão animador quanto esperavam seus participantes. Ainda que tenham oferecido aos cavaleiros e aos camponeses do século XI uma saída para o excedente populacional, na prática seus resultados foram quase nulos. Na verdade, o Mediterrâneo nunca chegou a ser um “mar deserto”, fechado pelos muçulmanos, como se acreditou por um tempo. As cidades da península Itálica, por exemplo, mantiveram-se ativas durante a Idade Média e seu comércio com o Oriente sempre foi relativamente intenso. Da mesma forma, ocorriam intercâmbios culturais e econômicos entre cristãos e muçulmanos na península Ibérica. Seja como for, ao fundar reinos cristãos no Mediterrâneo oriental, os cruzados promoveram a expansão das sociedades européias e fizeram entrar em circulação na Europa produtos orientais, sobretudo especiarias, importadas por mercadores da península Itálica. Os saques realizados pelos cruzados nas cidades muçulmanas transferiram para a Europa grande quantidade de moedas, aumentando sua circulação no continente. Isso colaborou para que surgissem companhias mercantis, formadas pela associação de comerciantes, que investiam capital na compra de barcos e de mercadorias.
Com a reativação do comércio e das cidades a partir do século XI, expandiram-se a economia monetária e o mercado, fortalecendo a burguesia mercantil. Estimulados pela formação de um mercado consumidor, os senhores procuraram aumentar a produção de seus feudos. As relações servis entraram em crise. Muitos servos se tornaram livres e passaram a arrendar terras dos senhores com base em contratos. Outros migraram para as cidades, desligando-se das relações servis de produção. Com o desenvolvimento comercial, todo o sistema feudal entrava em crise.
De modo geral o livro compõe-se em uma verdadeira viagem ao gênese da Europa, a Idade Media, invadindo o imaginário e o tempo que constrói a historia sem deixar de obter em suas entrelinhas a busca da verdade.

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