1939 a 1942 – Brasil na II Guerra Mundial: Tempos de neutralidade

 

O Brasil participou ativamente da Segunda Guerra Mundial. Tal participação pode ter sido modesta se comparada a de outros países que entraram mais cedo no conflito, mas foi de suma importância para a vitória dos Aliados.

O Brasil ajudou os Aliados fornecendo matérias-primas, patrulhando o Atlântico com navios da Marinha, que escoltavam os navios mercantes para protegê-los dos ataques de submarinos alemães, enviando pilotos da Força Aérea e uma Força Expedicionária para lutar na Itália ocupada pelos nazistas.

Além disso, cumprindo uma resolução aprovada na reunião dos representantes das repúblicas americanas realizada no Rio em 1942, o governo brasileiro autorizou o uso de bases aéreas e portos das regiões Norte e Nordeste pelas forças armadas dos Estados Unidos.

Essa postagem é a primeira de uma série, ricamente ilustrada por fotografias, sobre a participação do Brasil na Segunda Guerra Mundial.

 

Um soldado da Força Expedicionária Brasileira (FEB) dá um beijo de adeus no seu filho em uma estação de trem, na partida para a Europa, onde lutaria na Campanha da Itália. O Brasil se juntou aos Aliados ao declarar guerra às nações do Eixo em 1942. Foi a única nação sul-americana soberana a enviar tropas para lutar no continente europeu. Rio de Janeiro, Brasil, agosto de 1944.

Acima, o registro fotográfico da concentração Integralista, em Blumenau – SC, durante as comemorações do dia da bandeira, em 19 de novembro de 1937.

Durante a década de 1930, a política interna no Brasil tinha várias semelhanças com as lutas que ocorriam na Europa entre partidos de esquerda e de direita.  Por exemplo, o partido conhecido como Ação Integralista Brasileira, criado em 1932 como uma imitação deliberada dos partidos fascistas europeus.

Apesar de boa parte dos membros negarem qualquer relação do integralismo com o nazismo, o fato é que existiram integralistas que defendiam os ideais nazistas. Gustavo Barroso, que certamente foi um dos mais influentes ícones do Movimento Integralista Brasileiro, além de deter um cabedal de títulos e funções importantes no cenário mundial, foi responsável pelos movimentos antissemitas sendo notável sua contribuição com a tradução e defesa ferrenha do livro Protocolos dos Sábios de Sião.

Entretanto a notoriedade da sinergia entre os Camisas Verdes (integralistas) e os nazistas não são apenas distintos ao caso supracitado. Do mesmo modo que o nazismo ostentava uma braçadeira com o símbolo da suástica, os integralistas o faziam com o símbolo do sigma, além disso, o cumprimento anauê dos integralistas era feito da mesma maneira que a saudação Heil Hitler.

Getúlio Vargas era simpático ao nazifascismo. Ele também era simpático aos regimes ditos fortes, nos quais um governo centralizado pode governar sem qualquer oposição. Tal simpatia com o autoritarismo tornou-se evidente quando Vargas anulou a Constituição e se tornou ditador em 1937. O presidente Vargas demonstrou uma atitude ambígua em relação à Ação Integralista Brasileira. Por um lado, ele tirou proveito dos integralistas porque eles eram contra o comunismo, mas quando começaram a criar problemas internos, os integralistas tiveram que ser eliminados antes que se tornassem tão fortes  a ponto de minar governo de Vargas.

Em 1937, Vargas proscreveu a Ação Integralista Brasileira e os partidos comunistas, ordenando o seu desmantelamento. Ele também proibiu a atividade política nazista em todas as províncias brasileiras. Naquela época, Vargas, devido à pressão interna, alinhou seu governo em direção a uma “política nacionalista”, evitando a familiaridade com os regimes fascistas. Independentemente desse alinhamento, o radicalismo ainda era evidente na sociedade brasileira e o poder da ditadura de Getúlio Vargas aumentaria gradualmente a partir de 1937.

Essa foto antiga, onde vemos a bandeira nazista tremular ao lado da Bandeira Brasileira, retrata a Sede distrital do Governo de Santa Catarina em 1934 (Arquivo Histórico de Blumenau).

O Brasil havia recebido um grande número de imigrantes italianos e alemães há mais de cem anos antes da Segunda Guerra Mundial e seus descendentes tinham conquistado posições importantes no governo e na sociedade brasileira, inclusive nas Forças Armadas Brasileiras, portanto, eles tinham uma influência significativa nas tomadas de decisão do governo brasileiro. Na década de 1930, os imigrantes alemães no Brasil eram mais de 900.000 e os italianos mais de 1.500.000;  a maioria deles vivia no sul e no sudeste, as duas regiões mais desenvolvidas no Brasil.

A relação entre o Brasil e a Alemanha depois de Adolf Hitler se tornar chanceler foi se reforçando ano após ano até 1940. A Alemanha tornou-se o segundo parceiro comercial mais importante do Brasil, logo atrás dos Estados Unidos, importando matérias-primas e produtos agrícolas e exportando manufaturados. Estabelecer um vínculo comercial estratégico com o Brasil era um dos  objetivos alemães e o Exército Brasileiro acreditava que seria mais fácil “trocar” café brasileiro, algodão, ferro e outros produtos por armas alemãs do que negociar  mercadorias similares com os Estados Unidos.

Para dissociar seu governo dos regimes fascistas e nazistas vistos na Europa, Vargas tomou medidas fortes para reduzir a influência alemã e italiana nas comunidades do sul do Brasil, onde  alemães e italianos ainda mantinham sua língua e tradições originais. As atividades políticas nazistas e as bandeiras nazistas foram proibidas e a Língua Portuguesa tornou-se obrigatória para todas as ocasiões.

Getúlio Vargas (centro) e seus seguidores durante sua curta estada em São Paulo no caminho para o Rio de Janeiro, após a bem-sucedida Revolução Brasileira de 1930.

No começo da Segunda Guerra Mundial, o Brasil não estava economicamente e militarmente preparado para deixar sua neutralidade e unir-se aos Aliados. O Brasil mantinha sólidas relações com a Alemanha e com os Estados Unidos. Portanto, o país estava dividido e permaneceria no “fio da navalha” para manter-se neutro, neutralidade essa que resistiu por quase dois anos após o início da guerra.

O Presidente Getúlio Vargas conduziu o que alguns historiadores brasileiros, como Hélio Silva e Mércio Scalércio, chamaram de política do “pêndulo”, ou seja: Vargas tentou tirar o máximo  de proveito tanto dos Estados Unidos quanto da Alemanha. O brasilianista, Frank McCann escreveu o seguinte sobre a estratégia do ditador brasileiro: “Na década de 1930, tanto a Alemanha quanto os Estados Unidos buscaram manter a orientação exportadora do Brasil. Seus interesses eram estratégicos e não ideológicos. Getúlio Vargas tentou colocar o país em um curso de desenvolvimento de tal forma que o comércio com ambas as grandes potências continuaria, garantindo assim o apoio do setor externo. Ao mesmo tempo, ele tentou convencer a Alemanha e os Estados Unidos de que ajudar o desenvolvimento brasileiro seria de seus interesses, acalmando assim o setor interno. Era um jogo delicado que exigia um equilíbrio constante de interesses.”

Os ministros Arthur de Souza Costa (à direita), da Fazenda; Oswaldo Aranha (centro), titular das pastas da Justiça, Fazenda e Relações Exteriores e Eurico Gaspar Dutra, da Guerra.

O Brasil participou das Conferências realizadas em Buenos Aires em 1936 e em Lima em 1938, onde se enfatizou o panamericanismo, doutrina na qual os países americanos concordaram em ajudar as repúblicas americanas “irmãs” contra qualquer invasão do Eixo. A Declaração de Lima reforçou a posição dos Estados Unidos em combater a influência do Eixo na América Latina e abriu a possibilidade aos países latino-americanos de defender o mundo ocidental contra o perigo representado pelas potências do Eixo. Nesse ponto, o Brasil se comprometeu a apoiar os Estados Unidos no caso de uma guerra.

Também vale ressaltar que houve várias reuniões entre diplomatas brasileiros e americanos, bem como conversas privadas entre o Presidente do Brasil, Getúlio Vargas, e o Presidente dos Estados Unidos, Franklin D. Roosevelt. Durante uma dessas conversas, o Presidente Roosevelt destacou ao Presidente Vargas a necessidade de estabelecer acordos bilaterais entre o Brasil e os Estados Unidos, reafirmando a longa e tradicional relação entre esses dois países.

Roosevelt sabia que o Brasil seria muito importante para o esforço de guerra por três razões. Primeiro: o Brasil ocupava uma estratégica posição geográfica. Em segundo lugar: o país possuía importantes suprimentos, como produtos agrícolas e matérias-primas para as indústrias dos Estados Unidos, bem como grandes reservas de minérios. Terceiro: negar o acesso do Eixo à América Latina.

Roosevelt solicitou uma representação brasileira especial em Washington para discutir as preocupações brasileiras e norte-americanas na defesa das América e, se necessário, para lutar contra as forças do Eixo. Em janeiro de 1939, Vargas enviou  Ministro das Relações Exteriores do Brasil, Osvaldo Aranha, com uma carta branca  para negociar em nome do Brasil.  A Missão de Aranha deixou claro para qual lado a política brasileira iria pender.

Walt Disney com sua esposa Lillian e o presidente Getúlio Vargas com sua esposa, Darcy, no lançamento do filme de Walt Disney “Fantasia”, Rio de Janeiro – Agosto de 1941.

Em 17 de agosto de 1941, Walt Disney desembarcou no Brasil. Na ocasião, Disney fazia parte do grupo que defendia a “Good Neighbor Policy” (Política da Boa Vizinhança), iniciativa do presidente americano Franklin D. Roosevelt para estreitar as relações econômicas e diplomáticas entre os Estados Unidos e os países latino-americanos.

A intensificação das questões diplomáticas e militares entre Brasil e Alemanha se tornaram tão evidentes que a cooperação entre os dois países foi percebida como um possível problema na América do Sul pelos Estados Unidos. O cientista político brasileiro Ricardo Seitenfus afirmou em 1985: “Os negócios, a criação e execução de leis, as relações políticas, diplomáticas e militares entre os dois países cresceram tanto que os Estados Unidos ficaram assustados. Advertidos pela imprensa, eles estavam preocupados com a atividade nazista no Brasil e passaram a lutar contra o crescimento da posição alemã – principalmente no setor comercial. A estreita relação entre o Brasil e a Alemanha era evidente em seus negócios, na luta anticomunista, nas leis e na cooperação política e, eventualmente, na crescente influência dos nazistas-germânicos no Brasil”.

Apesar da sólida relação com a Alemanha e a Itália, os diplomatas brasileiros evitavam se identificar com as ambições internacionais da Alemanha nazista e continuavam a enfatizar a importância de uma estreita relação com os Estados Unidos, razão pela qual o Brasil e os Estados Unidos continuaram a negociar programas de intercâmbio militar, bem como a cooperação em uma possível guerra. Os Estados Unidos pressionaram o apoio dos países americanos, em especial o apoio brasileiro, porque sabiam que a guerra era iminente. Durante esse período, o Brasil dispunha de duas possibilidades de ação: a primeira era escolher os Estados Unidos como aliados e a segunda era escolher a Alemanha como aliada. Vários acordos favoreciam a segunda opção; contudo, a relação Brasil-Estados Unidos seria mais forte, mais lucrativa e mais confiável do que a relação com a Alemanha.

O Brasil aproveitou sua neutralidade para continuar a negociar com a Europa. A situação só mudou quando a Alemanha declarou um bloqueio marítimo no Oceano Atlântico contra os países americanos, alertando  que tomaria todas as medidas necessárias para manter esse bloqueio. A Alemanha também afirmou que países como o Brasil e os Estados Unidos, que apoiavam a França e a Grã-Bretanha com suprimentos, seriam atacados.

Como resultado, a Alemanha despachou submarinos (U-boats) para atacar navios mercantes que operavam do Brasil para a Europa e para os Estados Unidos. Essa ação perpetrada pela Alemanha afundou um número significativo de navios brasileiros e tirou a vida de muitos dos nossos cidadãos. Esses ataques contra navios mercantes brasileiros desarmados foram o ponto de viragem na opinião do público brasileiro sobre a Alemanha nazista. A população realizou manifestações em todo o país, nas quais exigia que o governo retaliasse os ataques alemães. O presidente Getúlio Vargas não conseguiu manter a neutralidade brasileira por muito tempo e, por conseguinte, teve duas reuniões privadas com o presidente dos Estados Unidos, Franklin D. Roosevelt, explicando que o Brasil cooperaria com os Estados Unidos e que apresentaria as exigências brasileiras em matéria de finanças, equipamentos e treinamento militar.

O navio de guerra USS Arizona envolto em fumaça ao tombar no mar durante o ataque surpresa japonês a Pearl Harbor, no Havaí.

Reagindo ao avanço nazista, chanceleres dos países americanos (incluindo o Brasil) reuniram-se em Havana, Cuba, em julho de 1940. Nessa reunião, foi estabelecido que uma agressão a “qualquer nação americana” implicaria no envolvimento de todas as demais na guerra.

Isso finalmente aconteceu quando, em dezembro de 1941, os Estados Unidos entraram oficialmente no conflito por causa do ataque japonês a Pearl Harbor, uma base militar norte-americana no Havaí. Em decorrência do ataque a Pearl Harbor, os Estados Unidos declararam guerra ao Japão. A Alemanha nazista e a Itália fascista reagiram declarando guerra aos Estados Unidos.

A entrada oficial dos Estados Unidos na guerra levou os representantes dos países americanos a se reunirem novamente, dessa vez no Rio de Janeiro, então capital do Brasil. Nessa reunião, realizada em 28 de janeiro de 1942, a maioria dos países decidiu ficar ao lado dos Estados Unidos, rompendo relações diplomáticas com o Eixo. As únicas exceções foram a Argentina e o Chile.

Getúlio Vargas reunido com seu ministério após a declaração de guerra ao Eixo, 1942. Rio de Janeiro.

Assim que o Presidente Roosevelt foi informado da decisão brasileira de reconhecer um estado de beligerância com o Eixo, ele telegrafou a Vargas a seguinte mensagem: “Fui informado que os Estados Unidos do Brasil reconheceram hoje que existe um estado de guerra entre o Brasil, por um lado, e a Alemanha e Itália, por outro”.

“Em nome do Governo e do povo dos Estados Unidos, exprimo à Vossa Excelência a profunda emoção com que esta ação corajosa foi recebida neste país. Esta decisão solene alinha mais firmemente o povo do Brasil com os povos livres do mundo em uma luta implacável contra as potências sem lei e predatórias do Eixo. Acrescenta poder e força, moral e material, aos exércitos da liberdade. Como irmãos de armas, nossos soldados e marinheiros escreverão uma nova página na história da amizade, confiança e cooperação que tem marcado desde os primeiros dias de relações independentes entre seu país e o meu.”

Em agosto de 1942, uma grande ofensiva submarina da Alemanha foi lançada, na qual a Alemanha conduziu a mais violenta série de ataques submarinos contra navios brasileiros, torpedeando qualquer navio que encontrasse no Atlântico Sul. O submarino alemão U-507  torpedeou e afundou, em menos de dez dias, seis navios brasileiros, incluindo quatro navios de passageiros, resultando em mais de 300 mortes.

Esses ataques de submarinos alemães motivaram novamente a opinião pública brasileira a solicitar uma reação imediata do governo de Vargas  contra a Alemanha . Manifestações em massa irromperam por todo o país. Milhares de pessoas participaram delas, exigindo a imediata retaliação brasileira, a adesão do Brasil à causa aliada e a declaração de guerra contra as potências do Eixo. Até mesmo as Forças Armadas, onde os altos oficiais sabiam quão fracas eram as forças brasileiras e como o Brasil estava despreparado para ir à guerra contra o Eixo, exigiram uma ação firme de Vargas.


Encenação de estudantes brasileiros contra o Eixo, 1942.

Os líderes militares brasileiros defendiam que o Brasil deveria participar não só apoiando o esforço de guerra com recursos materiais e patrulhando o Atlântico Sul, mas também preparando uma força expedicionária para ser empregada com as forças aliadas no norte da África ou na Europa. Portanto, não restava alternativa ao governo brasileiro. Assim, em 22 de agosto de 1942, o Brasil declarou guerra e se juntou aos países aliados dos Estados Unidos da América. A assistência dos Estados Unidos foi aumentada depois da declaração formal de guerra do Brasil, sendo quase 75% de toda a ajuda financeira que os Estados Unidos deram à América Latina.

A ambivalência brasileira em relação à guerra havia mudado para uma política de cooperação e participação efetiva com os Aliados. O próprio presidente Vargas acreditava plenamente que essa chance de participar de tal combate beneficiaria inteiramente o Brasil dentro da nova ordem mundial que existiria após a II Guerra Mundial.  Em sua visão, o Brasil devia se esforçar para obter, pelo menos, uma melhor posição na política mundial, preeminência na América do Sul,  poderio militar, as bases de uma indústria de guerra, bem como o estabelecimento de uma base industrial.

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